El Jem era uma das cidades da Tunísia que tínhamos decidido visitar apenas de passagem. Isto porque tínhamos pouco tempo e a cidade, em geral, parecia não ter pontos de interesse suficientes para nos demorar muito. No entanto, sabíamos que El Jem tem duas grandes atracções de nível mundial: o anfiteatro romano e o Museu Arqueológico, e foi com o objectivo explícito de visitar esses locais que nos dirigimos para El Jem de comboio, vindos de Sousse.
Mal chegámos à estação de El Jem, tentámos deixar lá as mochilas, mas com os tempos de medo do terrorismo que se vivem, as salas de arrumos estão em desuso na Tunísia. Pedimos indicações para chegar ao anfiteatro romano, mas ele estava logo ali à vista, à saída da estação, destacando-se ao fundo de uma “avenida” e dominando, da sua altura imponente, todas as construções da pequena cidade.
E é uma visão invulgar e intrigante. Fez-me lembrar quando tive pela primeira vez um vislumbre das Pirâmides de Gizé, agora envolvidas pelo crescimento caótico do tecido urbano da cidade do Cairo. Tal como as pirâmides, o anfiteatro pareceu-me completamente fora do sítio, deslocado no tempo, e com uma estrutura completamente diferente daquilo que o rodeia, quase uma construção extra-terrestre, bela e silenciosa, no meio do caos terrestre.
Mas o passado dos anfiteatros romanos é tudo menos belo e silencioso. Lá dentro, jogavam-se jogos de morte, ruidosos, sangrentos, envolvendo as venationes, lutas com animais selvagens (vindos do interior do continente africano), ou lutas entre gladiadores, e ainda o martírio (por crucificação, cremação ou morte por animais selvagens) de criminosos, mas também de pessoas que defendiam ideias perniciosas para o império, como os partidários da então emergente seita religiosa dos cristãos.
Hoje, tudo isso é passado, mas o edifício onde tudo aconteceu resistiu aos desafios do tempo e, mesmo em ruínas, consegue ainda impressionar todos aqueles que o visitam quase dois mil anos após a sua construção.
Construído em 230-238 d.C., numa das cidades romanas mais ricas de África, é o terceiro maior anfiteatro romano do mundo, e com um grau de preservação notável, tendo em conta tudo aquilo que passou desde então, exibindo uma enorme arena elíptica (65 × 39 m) e três andares de bancadas, atingindo 30 m de altura. Mas, desde que as multidões deixaram de o visitar, iniciou-se uma longa marcha de exércitos estrangeiros e impérios conquistadores, todos fazendo questão de retirar um pouco da sua antiga glória. Porque a obra era de tal magnitude e excelência que, para aqueles que queriam apagar a memória do império romano, ou anular a beleza das suas edificações, não havia outra acção senão o roubo e destruição.
Hoje, num dos lados, os dois andares superiores desapareceram, mas a sua integridade como um todo é notável. Quando percorremos os seus recantos, não é necessário um grande esforço de imaginação para conseguirmos visualizar trinta mil pessoas a vibrar nas bancadas, a arena cheia de homens e animais, sob as arcadas os corredores cheios de movimento, e o rebuliço e adrenalina dos subterrâneos, por baixo da arena. Temos sorte, assim, que estas construções tenham chegado aos nossos dias, e El Jem é um daqueles locais que é obrigatório visitar para se ter uma visão in loco dos momentos gloriosos, e ignominiosos, daquele grande império que se estendeu também pelo continente africano.
Mas El Jem ainda tem outro tesouro para nos mostrar, mais outro testemunho da beleza e requinte das classes da elite romana. Pois era ali, no norte de África, no que é hoje a Tunísia, que se encontrava a primeira colónia romana, a primeira expansão do império além das suas fronteiras. Depois da queda de Cartago, Roma decidiu expandir-se, construindo por cima dos escombros das cidades que os desafiaram, e potencializando as cidades que tinham tomado o seu lado do conflito, como o caso de Thysdrus, agora El Jem.
Ali, os seus governantes e famílias habitavam em casas cheias de requinte, de luxo, e de obras de arte, e é numa zona de villas ainda conservadas que se encontra um dos museus mais notáveis da Tunísia, dedicado inteiramente aos mosaicos que adornavam as casas dos cidadãos romanos abastados e os venerados templos. Coloridos, imponentes, requintados, verdadeiras obras de arte, representam cenas do quotidiano, divindades, animais e homens, e constituem uma das mais fascinantes manifestações culturais romanas a chegar aos nossos dias.
O Museu Arqueológico de El Jem fica aproximadamente a 500 metros do anfiteatro e, para além dos fabulosos mosaicos, expõe uma villa romana (para aí deslocada do centro de El Jem), extraordinariamente bem conservada, e plena de retratos do quotidiano da província africana de Roma. Ao lado do museu, encontra-se uma rua escavada que exibe as fundações de várias villas romanas, ainda com alguns mosaicos in situ.
Por tudo isto, o museu é uma visita complementar ao anfiteatro, e igualmente importante, sendo que os dois locais, em conjunto, nos permitem ter uma visão deslumbrante do auge do império, quando o que é hoje a Tunísia era então a enigmática, rica e exótica província africana de Roma.
Hoje, El Jem chama a atenção de todos que visitam a Tunísia, e merecidamente, pois não deixará ninguém decepcionado.
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