As tribos Lotuku no sul do Sudão do Sul eram um dos objectivos desta viagem. Partimos do norte para o sul do Sudão do Sul no dia anterior, onde dormimos pela primeira vez num hotel nesta viagem. Tivemos chuveiro e água, embora só fria e com apenas um fio a escorrer pelo cano. Era o melhor hotel da cidade, antes de rumar às tribos Lotuku. Saímos de manhã cedo rumo a outra região tribal, desta vez nas montanhas, onde habitam as tribos Lotuku. Pelo caminho as estradas de terra vermelha, a cor de África.
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As tribos Lotuku das montanhas do Sudão do Sul
As estradas do Sudão do Sul são o retrato deste país, esburacadas, cheias de remendos que não tapam nada, e repletas de crianças. Há check points espalhados pelo país e é preciso muita paciência e dinheiro para os atravessar. O dinheiro circula por baixo dos papéis, entre os documentos e permissões. Só assim se consegue prosseguir.
Algumas horas depois de conduzir acompanhando uma cordilheira montanhosa chegámos às montanhas onde vivem as tribos Lotuku, mais um grupo étnico, desta vez minoritário, que vive quase isolado nas vertentes graníticas das montanhas. Para alcançar a aldeia das tribos Lotuku é preciso subir por um trilho. Há cobras por ali e todo o cuidado é pouco.
Somos recebidos no átrio da aldeia por um conselho de homens das tribos Lotuku. Depois de um pequeno ritual de conversação entramos, mais uma vez acompanhados por um militar. Para explorar a aldeia é preciso subir montanha acima e é isso que fazemos.
As habitações das tribos Lotuku são maravilhosas e decoradas com lama e pintadas. Os espigueiros guardam os cereais afastados do chão. Somos convidados a entrar nas casas, algo que nunca tinha acontecido no Sudão do Sul. Na realidade, não é mesmo no interior mas sim no seu pátio interior. A habitação das tribos Lotuku funciona como um quarto e para lá entrar teríamos de nos baixar e entrar de gatas. Entramos numa casa cerimonial, onde se fazem os rituais da tribo, repleta de bombos e lanças, que de 22 em 22 anos passam de líder para líder das tribos Lotuku.
Como em qualquer aldeia do Sudão do Sul, a quantidade de crianças das tribos Lotuku impressiona. São dezenas e parecem sair de todo o lado. Exibem as chamadas barrigas da fome, muitas vezes associadas, erradamente, ao consumo de água para enganar o estômago. Porém a realidade é outra. Estas são barrigas doentes, geralmente, de crianças que têm schistosomose, que é uma doença tropical associada ao consumo de água contamina por dejectos humanos e que permite o desenvolvimento de larvas que se alojam no fígado do hospedeiro. A maioria destas crianças tem schistosomose e leptospirose, já que o Sudão do Sul tem uma das maiores epidemias destas doenças no mundo.
Nem no Sudão do Sul, nem nas tribos Lotuku, nem em qualquer outro lugar do mundo, tudo é aquilo que parece. Quando olhamos o mundo de forma superficial alimentamos uma ignorância crescente na sociedade. Para contrariar esta ignorância no mundo dito desenvolvido é preciso olhar a fundo, perceber os porquês e ter muitas dúvidas. Sem elas, nunca sairemos do maior paradigma dos nossos tempos; vivemos na Era da Informação, mas cada vez somos mais alimentados por estereótipos simplistas e generalistas, abdicando da nossa capacidade de pensar e reflectir. É o mundo que nos dá essa capacidade. E visitar estas e outras tribos ajuda-nos nesse caminho.
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