Depois de visitarmos a região do delta, o nosso itinerário seguia para norte, em direcção a uma cidade cuja história remonta ao encontro das civilizações europeia e africana. Essa cidade é Saint Louis, a primeira colónia francesa em África, estabelecida em 1659. Na realidade, no entanto, a região da foz do rio Senegal, que divide actualmente a Mauritânia e o Senegal, foi “visitada” pela primeira vez pelos portugueses durante o século XV.
O comércio de escravos, inaugurado pelos portugueses (aproveitando práticas locais ancestrais) e expandido por franceses e ingleses, fez com que a cidade se tornasse um centro de comércio florescente. A riqueza dos comerciantes envolvidos no tráfico de escravos era o motor de uma sociedade dinâmica e cosmopolita, caracterizada por uma mistura entre as diferentes raças, surgindo os mestiços, que tinham um papel relevante na sociedade.
Saídos de Joal, ainda no delta, tivemos de tomar a já usual série de transportes colectivos para chegar a Saint Louis, no caso, um táxi até à gare de Joal, um sept-place até Thies e outro daí até à gare de Saint Louis, a poucos quilómetros da cidade. O nosso hotel localizava-se na hydrobase, a sul do bairro dos pescadores, por isso apanhamos um táxi para lá chegar. Pelo caminho, atravessamos a que é, provavelmente, a obra arquitectónica mais marcante da cidade, a ponte Faidherbe, e também ela um testemunho da herança colonial e da mistura daí resultante: a ponte foi desenhada por Gustav Eiffel e construída para atravessar o Danúbio, mas os seus arcos acabaram por ser transladados para Saint Louis em 1897 (ainda hoje com um aspecto brilhante e saudável devido a uma recuperação feita recentemente).
Entramos então no centro de Saint Louis (que voltaríamos mais tarde a percorrer a pé), considerado Património Mundial da Unesco em 2000, mas que se encontra num estado de degradação bastante considerável. É possível ainda observar alguns edifícios históricos, assim como casas com características distintamente europeias (inclusive portuguesas), tais como as varandas em ferro forjado, mas a verdade é que seria necessário um grande investimento público para poder recuperar e preservar este centro histórico, investimento esse impensável num país com as limitações (físicas, mas principalmente políticas) do Senegal. Mas se o Senegal quer continuar a rivalizar com outros países africanos (inclusive alguns seus vizinhos) na atracção do turismo europeu cada vez mais selectivo, será necessário despender algum dinheiro e esforço, para depois recolher os almejados frutos.
Passando da ilha para a Langue de Barbarie, entra-se na parte mais interessante e característica da cidade, ainda que não recomendável a estômagos frágeis. Virando à esquerda depois de cruzar a ponte Mustapha Malick Gaye, percorre-se o bairro dos pescadores, com uma fila interminável de pirogas atracadas na margem do rio, e, de um lado da estrada, os mais diversos “estabelecimentos comerciais” relacionados com a pesca e reparação dos barcos e, do outro, a casas dos pescadores. Fora a Índia, penso que nunca tinha visto tantas crianças por metro quadrado (aqui a natalidade deve atingir recordes!), assim como a quantidade de lixo nas ruas e margens do rio.
Mais a sul, passamos pelo mercado de peixe, onde os camiões vindos de Dakar estacionam e carregam o peixe que depois será distribuído pelo país inteiro. Logo a seguir, encontra-se uma grande unidade de processamento do peixe, onde é mantido em frio e assim transportado para os camiões.
Ainda mais a sul, passado um pequeno posto de controle de segurança, guardado por militares, entra-se na zona dos resorts. É como passar para um universo paralelo de jardins, piscinas e restaurantes à beira-mar plantados. E é aqui que se vêem mais turistas, pois lá fora passam “despercebidos” nos Land Rovers de vidros escurecidos. E, tal como no passado, em que os comerciantes europeus vinham passar uma temporada à cidade, mantendo por vezes aqui uma esposa mestiça e uma casa abastada, hoje em dia os turistas visitam a cidade por uns dias, mantendo normalmente uma distância confortável para com os locais e desfrutando dos prazeres de uma estância turística moderna.
É deste tipo de paradoxos que África vive actualmente; se, por um lado, é verdade que os turistas não contribuem directamente para a melhoria da qualidade de vida da maioria da população local, também é verdade que a sua ausência não seria melhor e que, mesmo que os donos dos resorts sejam estrangeiros (e em alguns casos não o serão), a verdade é que todos os trabalhadores são pessoas locais, cujo rendimento acima da média local contribuirá com certeza para confortar alguns estômagos mais necessitados.
O turismo não resolve a pobreza; mas também não é a sua causa, e não há que ter preconceitos em relação a isso.
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