O meu nome é John e sou açoriano das Flores de alma e coração.
O dia começou sem sol, com nuvens e cheio de vento. Da promessa de mau tempo para hoje, felizmente tivemos pouco. Como não chovia, resolvemos arriscar a fazer um trilho a pé, o mais afamado dos Trilhos da ilha das Flores, o PR1, que liga o Farol de Albarnaz à Fajã Grande.
– John, pode vir buscar-nos à Fajã?
– Claro que sim! Daqui a 20 minutos estou aí. Se me atrasar é porque apanhei gado nas lagoas.
Deve ter apanhado algum porque John demorou 25 minutos. O John nasceu em Boston, filho de pais emigrantes açorianos que na década de 60 foram à procura do El Dourado americano. Viveu nos Estados Unidos até aos 30 anos, altura em que os seus pais decidiram voltar para as Flores. John veio também, de armas e bagagens, desta vez mais tempo do que as típicas férias de Verão. No entanto, não conseguiu adaptar-se totalmente e ainda hoje vive seis meses lá, seis meses cá. No Verão é taxista nas Flores. No Inverno faz a manutenção de um ginásio em New Bedford. Tivemos a sorte de o conhecer aqui nas Flores e levou-nos de manhã até ao Farol de Albarnaz, onde iniciamos o trilho. Pelo caminho encantou-nos com as suas histórias de imigrante. Quando nos despedimos, perguntei-lhe: o que não posso deixar de fazer antes de sair das Flores?
– Comer o polvo no Jonas! – Respondeu prontamente.
Em menos de 30 segundos já tínhamos o telefone do Jonas, da Fajã Grande. “Só por encomenda”, disse-nos antes de partir. E assim fizemos, ainda antes de começar a caminhar, telefonámos para o Jonas e encomendámos polvo para dali a 3 horas. Terminaríamos o percurso, e teríamos almoço à espera. Um luxo.
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Trilhos da ilha das Flores
O sol iluminou dois terços do nosso percurso pelos Trilhos da ilha das Flores, exibindo o esplendor da costa noroeste das Flores, cheia de ilhéus e baías intocadas pelo homem. Até custa acreditar que ainda haja lugares assim na Terra.
Fomos caminhando, cruzando quedas de água, ribeiros, campos agrícolas, campos de flores, subindo e descendo vertentes escarpadas e escadarias de socalcos de pedra. Um caminho magnífico, sempre muito bem sinalizado.
Parámos várias vezes, para contemplar estas dádivas da natureza, completamente imaculadas. A vegetação atlântica, como quase já não vê em nenhum lugar do mundo, é exuberante e ganha em luxuria a quase todos os lugares do mundo.
Três horas depois chegávamos à Ponta da Fajã, uma aldeia encantadora, de onde seguimos como que sob o olhar atento de várias quedas de água que desciam na nossa direção até à Fajã Grande.
Jonas e a mulher já nos esperavam, com um magnífico queijo fresco e pão caseiro, enquanto ultimava o “herói” do dia, o delicioso polvo guisado com batata doce. Lambuzámo-nos ao almoço. Como reis!
À tarde fomos explorar outros Trilhos da ilha das Flores. Começámos pelo Poço do Bacalhau, uma queda de água vertiginosa que cai numa área de azenhas e moinhos na Fajã (um deles onde se pode alojar – pode ver aqui).
Mesmo sem sol, mas também sem nebulosidade, decidimos passar para a parte superior das Flores e tentar visitar as lagoas. Conseguimos ver a Lagoa Comprida e a Lagoa Negra completamente limpas e ainda tivemos tempo para um pequeno trilho nas imediações. Mais um dos Trilhos da ilha das Flores.
De seguida passámos para a Lagoa Seca, magnífica, uma das nossas preferidas na ilha, onde até conseguimos colocar o drone a voar. Foi por pouco tempo porque o vento começou a soprar com bastante força e a cada rebolão temíamos pela nossa mais recente aquisição.
Seguimos para a Lagoa Branca, que também se exibiu para nós, completamente limpa, embora agora o vento fosse tanto que quase nos arrastava pelo ar.
No entanto, o vento mais forte que apanhámos foi no Morro Alto, o ponto mais alto da ilha, onde quase nem conseguíamos abrir as portas do carro. As vistas eram boas mas o vento era tanto que quase não conseguíamos desfrutar da paisagem.
Seguimos para a Lagoa da Lomba, que só depois de um exercício de paciência conseguimos ver sem um capacete de nuvens e daí para a Lagoa Funda e Lagoa Rasa, sem nuvens, mas com o ceú completamente encoberto. Só quando descemos, em direcção a Lajedo, o ceú se abriu e os raios solares iluminaram a tarde.
A Rocha dos Bordões, que já tínhamos tentado ver noutro dia, exibia-se de forma magistral demonstrando toda a sua beleza e singularidade. Do miradouro contemplamo-la mas foi de uma paragem na estrada que conseguimos lançar o drone para a ver um bocadinho melhor. No entanto, ali o vento já estava bastante forte e não conseguimos voar com o drone para cima da rocha.
Seguimos para a Aldeia da Cuada, onde nos iríamos alojar de forma tradicional nos dois dias seguintes, mas não resistimos e parámos novamente no Poço da Ribeira do Ferreiro, desta vez com um sol de fim de tarde maravilhoso. O drone voou, a gopro fotografou, assim como todas as outras câmaras. Enterrámo-nos na lama para conseguir belas perspectivas e até fizemos equilibrismo nas rochas.
Na Aldeia da Cuada recebeu-nos Andreia, uma miguelense bem disposta e alegre, que nos apresentou o conceito do Turismo de Aldeia da Cuada. Deiáamo-nos encantar pelas histórias da Andreia. Ficámos alojados na Casa Xavier, o antigo proprietário que foi para os EUA em busca do sonho americano. Gostámos tanto da casa e da aldeia que ainda tivemos tempo para nos sentarmos nas espreguiçadeiras (embora quase sem sol) a beber um vinho tinto, acompanhado com queijo fresco e bolo lêvedo que tínhamos comprado no dia anterior.
Para prepararmos o estômago para o jantar, deixámo-nos perder nos caminhos e vielas da aldeia, espreitando as casas reconstruídas (lindas), o ambiente rural dos campos, a capela em honra da Glória do Espírito Santo e o gado a pastar nos lameiros.
Terminámos o dia a jantar no restaurante da aldeia, na companhia de um casal de Guimarães, cujo senhor tínhamos conhecido no trilho durante a manhã. Quando recolhemos ao quarto, o vento já soprava bastante forte, quase ciclónico, deixando antever que o dia seguinte não será dos melhores. Há aviso de mau tempo para as Flores e os ilhéus sabem que os voos deverão ser cancelados. Para nós tudo isto é novidade, mas esta dinâmica das ilhas é muito interessante e tem sido uma aprendizagem constante perceber como em pleno século XXI, num dos mais países mais desenvolvidos do mundo, se pode ainda viver com tão pouco. Continua-se a viver completamente isolado, abastecidos de alimentos por barco apenas uma vez a cada duas semanas. Portugal Insular ainda vive como há 30 anos atrás, e mesmo com o crescimento do turismo, não há forma de combater esta sensação de isolamento.
Veja as crónicas da nossa viagem à ilha das Flores aqui
- Crónicas da Ilha das Flores – Açores | Dia 1 – Chegamos ao meio do Atlântico!
- Crónicas da Ilha das Flores – Açores | Dia 2 – Vamos até ao Corvo!
- Crónicas da Ilha das Flores – Açores | Dia 3 – Pelos trilhos da ilha
- Crónicas da Ilha das Flores – Açores | Dia 4 – As Festas do Espírito Santo
- Crónicas da Ilha das Flores – Açores | Dia 5 – Presos na ilha!
- Crónicas da Ilha das Flores – Açores | Dia 6 – O regresso