A água escorre pela janela abaixo. Ouve-se as gotas fortes a bater nas telhas de terracota. O vento sopra e assobia como se viesse directo das outras ilhas dos Açores até às Flores. O dia começou cumprindo-se a promessa da noite anterior, isto é, com muita chuva e vento. Foi assim a noite toda, e de manhã o tempo continuava muito instável. Deixámo-nos ficar então na cama mais um pouco. A nossa casinha na Aldeia da Cuada parecia-nos um verdadeiro lar nos Açores enquanto ouvíamos o vento rugir lá fora e a chuva a cair nos vidros das janelas e no telhado. Era dia de Festas do Espírito Santo.
Tomámos o pequeno-almoço em casa fazendo umas torradas de bolo lêvedo com manteiga dos Açores. Maravilha! Ainda tivemos tempo de relaxar um pouco, e por volta do meio-dia o tempo começou a ficar melhor. Ainda muito nublado, mas sem chuva e com pouco vento.
Era tempo de sair e aproveitar o nosso último dia completo na ilha das Flores. Dois dias antes tínhamos conhecido um senhor em Santa Cruz que nos recomendou assistirmos às festas do Espírito Santo que iam acontecer no Domingo, na freguesia de Lomba, pertencente às Lajes das Flores, o concelho mais ocidental da Europa.
Foi para aí que nos dirigimos, sem saber muito bem o que esperar. A Carla já tinha assistido às festividades na ilha Terceira, com a largada dos touros, mas cada ilha dos Açores comemora à sua maneira, tendo como pano de fundo a celebração religiosa do Espírito Santo nas sete semanas a seguir à Páscoa. As Festas do Espírito Santo.
A experiência das Festas do Espírito Santo
Na estrada entre Santa Cruz e as Lajes, encontrámos um aglomerado de carros e de pessoas. Sabíamos que tínhamos chegado ao sítio certo das Festas do Espírito Santo.
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A Casa do Espírito Santo da freguesia da Lomba organizava as sopas do Espírito Santo, com pão e carne de vaca, aromatizada com hortelã e canela. O prato forte era a carne guisada acompanhada de massa sovada. Uma delícia que atraía pessoas não só da freguesia, mas também de toda a ilha.
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A cozinha era uma azáfama só, com a carne a ser cozinhada, as panelas a serem servidas, o molho a ser acrescentado ao pão e à hortelã. Ao lado, a casa do Espírito Santo era o salão onde as pessoas se reuniam à volta da mesa, em grupos, pois o espaço não dava para toda a gente ao mesmo tempo. É incrível pensar que uma celebração destas pode alimentar cerca de 700 pessoas, uma boa fracção da população da ilha, com cerca de 3600 habitantes. Tudo isso, fruto da organização daqueles que teimam em manter a tradição viva, e da generosidade daqueles, muitos emigrados em terras longínquas, que contribuem para tornar esta festividade religiosa num dia muito especial em que todos se reúnem e convivem à volta da mesa da casa do Espírito Santo.
Por vezes há famílias que doam uma vaca para poder ser repartida com centenas de pessoas que partilham esse momento de alegria e fraternidade. O modo de vida insular, e em particular o açoriano é cheio destas manifestações de solidariedade e entreajuda, algo fundamental para se poder viver numa terra que tem tanto de belo quanto de difícil. Nas ilhas dos Açores, todos são verdadeiramente uma só família.
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Da Lomba, seguimos para as Lajes das Flores. É uma pequena vila, junto ao mar, com uma igreja altaneira sobre o porto, e com um farol estrategicamente colocado num dos extremos da povoação. Não nos demorámos muito, pois queríamos ver se o tempo ainda se aguentava para podermos visitar alguns miradouros. No entanto, isso não se verificou.
Logo depois de sairmos das Lajes, o nevoeiro intensificou-se, principalmente nas terras altas. Com a chuva que se fez sentir na noite anterior, as cascatas estão com um vigor redobrado, e até algumas inexistentes no dia anterior fazem mostrar agora a sua magnificência. Até nos fez lembrar a nossa viagem à Islândia! É pena o nevoeiro não deixar vê-las em todo o seu esplendor…
Ainda assim fomos espreitar o Miradouro da Fajãzinha com alguma luminosidade, mas o Miradouro do Mosteiro estava quase totalmente envolto em nuvens, deixando muito pouco à mostra da bela paisagem.
Como não valia a pena ir mais para cima, resolvemos voltar à Aldeia da Cuada e à nossa casinha com vista para o mar. O sol ainda deu um arzinho da sua graça e pudemos tirar algumas fotos, até com o drone, desta bela aldeia, um excelente exemplo da recuperação de um espaço rural, reconvertendo um núcleo habitacional abandonado nos anos 60 do século passado num complexo destinado a turistas que queiram um contacto mais próximo com a natureza e com o que restou de um modo de vida cada vez mais difícil de encontrar.
Além disso, é considerado um dos 50 hotéis mais românticos do mundo… Estava assim lançado o nosso final do dia, com um belo prato de lapas grelhadas no restaurante da aldeia, e com um queijo fresco acompanhado de um bom vinho tinto já no aconchego da nossa casinha. Amanhã, se o tempo o permitir, será a hora de dizer adeus à ilha das Flores. Se não permitir, ficamos cá nos Açores! 😀
Veja as crónicas da nossa viagem à ilha das Flores aqui
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- Crónicas da Ilha das Flores – Açores | Dia 2 – Vamos até ao Corvo!
- Crónicas da Ilha das Flores – Açores | Dia 3 – Pelos trilhos da ilha
- Crónicas da Ilha das Flores – Açores | Dia 4 – As Festas do Espírito Santo
- Crónicas da Ilha das Flores – Açores | Dia 5 – Presos na ilha!
- Crónicas da Ilha das Flores – Açores | Dia 6 – O regresso
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Parabéns, Excelente o vosso gosto por viajar e conhecer o Mundo.
Obrigada, Fernando. 😀