Visitar Belém foi um dos pontos altos da nossa viagem à Cisjordânia, na Palestina. O que nos levou à cidade de Belém foi visitar o local do nascimento de Jesus mas depois, aproveitámos a nossa presença no local para explorar as marcas de uma guerra que dura há séculos e é tão visível ali em Belém.
VISITAR BELÉM NA CISJORDÂNIA – PALESTINA
A gruta do Leite e a Igreja da Natividade em Belém
Este é o local em Belém que marca o exacto lugar onde Jesus Cristo terá nascido em Belém. Hoje a Gruta do Leite em Belém, a gruta onde Maria terá dado à luz, no interior da igreja da Natividade, em Belém, marca o local de peregrinação para milhares de cristãos que rumam à terra sagrada do Médio Oriente.
Entrar na igreja de Belém é fácil se for cristão. As portas estão abertas, embora uma delas, a Porta da Humildade, bem pequena, exija que se baixe (segundo a lenda para que todos se dobrem perante o local mais sagrado do Cristianismo) mas, segundo a história, para impedir os ataques e entradas de cavalos nos tempos conturbados das lutas cristãs do Médio Oriente. Esta igreja de Belém é maravilhosa mas o que todos querem ver e tocar é mesmo no local onde Jesus Cristo nasceu.
Dizem que a Igreja da Natividade em Belém é a igreja mais antiga do mundo e inclui também a Capela da Majedoura, alvo de peregrinações também ali em Belém. O chão da igreja tem mosaicos que terão mais de 1700 anos e estão protegidos pois um novo solo foi aplicado sobre o piso original desta igreja em Belém. É fabuloso! Há mosaicos nas paredes e nas colunas também.
Como a Igreja da Natividade em Belém é um dos locais mais sagrados do mundo, foi dividida em três áreas distintas, a parte ortodoxa, a parte arménia e a parte católica. A Gruta do Leite e a Capela da Manjedoura estão localizadas na parte católica da igreja da Natividade em Belém.
Na Gruta do Leite, em Belém, existe uma estrela de prata com 14 pontas que marcará o local exacto do nascimento de Cristo. Todos querem tocá-la como sinal de devoção. O número de fiéis no local é sempre muito elevado.
Mas há mais duas grutas dentro da Igreja da Natividade, em Belém, que na realidade é uma basílica. Há a gruta do São Jerónimo e a gruta dos Inocentes, também locais de oração ali em Belém. Logo ao lado existe a Igreja de São Jerónimo de Belém, no mesmo complexo, que também merece uma visita.
Visitar o Campo de Refugiados de Dheisheh em Belém
Nos dias em que estivemos em Belém, na Cisjordânia, Palestina, visitámos o campo de refugiados de Dheisheh, na estrada que vai de Belém para Hebron. Ainda estivemos indecisos se o deveríamos ou não fazer mas, não queríamos ir embora de Belém sem ver esta realidade. Ainda bem que o fizemos.
Fomos recebidos por um rapaz novo que nos explicou que o campo de Belém foi criado em 1948/49, pela ONU, com refugiados provenientes de 47 aldeias palestinianas da zona de Belém e arredores e que ficaram do lado de Israel aquando da criação dos dois estados. Albergava inicialmente cerca de 3500 refugiados em Belém. O campo de Belém começou por ser um local temporário com tendas mas, depressa a ONU percebeu que as coisas não iam ser temporárias ali em Belém e, à medida que os anos foram passando e o número de refugiados ia aumentando, a ONU foi construindo mais abrigos e casas no campo de refugiados em Belém. Hoje, mais de 70 anos depois, o campo de refugiados em Belém deixou de ter tendas e tem prédios. Assemelha-se a qualquer bairro social pobre duma cidade ocidental, mas é um campo de refugiados em Belém desde 1948.
Viver num campo de refugiados toda à vida
Segundo o jovem que nos recebe em Belém, a polícia israelita faz rusgas no bairro todas as noites e continua a prender e a exercer represálias sobre os jovens palestinianos de Belém. No entanto, isto pareceu-nos inicialmente muito esquisito porque o campo continua a estar sob alçada da ONU. O que acontece é que, aparentemente, a ONU não consegue controlar nada ali no campo nem em Belém. A ONU tem um médico, uma escola com professores e um infantário ali no campo de Belém. Estas estruturas são insuficientes já que um único médico serve uma população de 13 000 habitantes que agora habitam o campo de Belém. As salas de aula ali no campo de Belém têm mais de 50 alunos.
As tropas israelitas, ao que parece, continuam a exercer força e instalam o medo no campo e por toda a cidade de Belém. As represálias vão desde as simples detenções a sovações de famílias completas, destruição de habitações e demolição de prédios no campo e na cidade de Belém. Nas paredes do bairro do campo de refugiados em Belém vêem-se grafites de um rosto repetidamente. Ao que parece, é um mártir que vivia no campo de Belém e foi morto pelos soldados israelitas recentemente.
Quando subimos ao telhado de um dos edifícios do campo em Belém, o jovem mostra-nos a extensão do campo. É impressionante! O rapaz chama a nossa atenção para um pormenor que nos teria passado despercebido (pelo menos no Médio Oriente): as habitações em Belém têm dezenas de depósitos de água nos telhados. Ao que parece Israel corta frequentemente o abastecimento de água em Belém e, por isso, eles reservam a água das chuvas nos terraços. Este corte da água na Cisjordânia deixa a população da Palestina em situações de privação.
De repente, uma das frases que vimos escritas no muro fazia sentido na minha cabeça “Turn on the water“! Mas, o pior não era isso. Nestes períodos de confronto mais intenso, o exército israelita dispara sobre os depósitos de água nos terraços em Belém, tentando esvaziá-los e diminuindo a quantidade de água que a população da Palestina dispõe para viver.
Ao fundo, em Belém, vemos o muro que tanto nos envergonha e que serpenteia os campos em Belém. Este muro que todos sabemos que estão a construir e que, toda a gente, finge não ver! É vergonhoso! Os palestinianos chamam-lhe “Apartheid Wall” porque é mais um muro discriminatório no século XXI!
O rapaz aponta-nos a construção de um novo colonato em Belém e nós vemos as casas e as máquinas a operarem. Queixa-se da presença de colonos em Belém e acusa Israel de estar a tentar criar uma faixa de colonatos entre Hebron e Belém para tentar dividir a Palestina. Segundo ele, estes colonatos recebem judeus americanos que vêm de férias por períodos de poucos meses ali em Belém.
Quando o questionámos sobre a situação futura da Palestina e os acordos que agora vão começar com Obama, mostra-se muito céptico e diz que não vão dar em nada. “Serão apenas uma oportunidade para os lideres comerem juntos”, diz em tom de desilusão. Acusa inclusive a Autoridade Palestiniana de ser corrupta.
Perguntamos-lhe o que ele achava que deveria acontecer com a cidade de Jerusalém, no caso de as negociações acertarem na criação efectiva de dois estados soberanos e independentes. Segundo ele, os palestinianos não aceitam dois estados. “Dois estados já eles têm e já está visto que não resulta”, diz. Querem um só estado na Palestina, como era antes de 1948 e tendo Jerusalém como capital. Ficamos um bocado surpreendidos porque achávamos que esta era a posição dos mais radicais mas não de todos os palestinianos. Mas a verdade é que os palestinianos não aceitam ali os judeus e o estado de Israel. Perguntamos-lhe “Então e os judeus, para onde irão?” Segundo ele, poderão continuar lá mas num estado muçulmano governado por palestinianos. Diz-nos que enquanto existir um estado de Israel nunca haverá paz porque este tentará sempre controlar a Palestina.
Deixámos para trás o campo de Belém levando na memória o artigo 194 das Nações Unidas que dá direitos aos refugiados palestinianos e que se encontra gravado numa laje na entrada do Centro de Refugiados de Belém. Na porta passamos por uma torre que seria de guarda e era o único acesso ao campo de Belém nos primeiros anos da sua existência ali em Belém.
A resolução do problema
Saímos do campo de Belém mais desiludidos e cépticos do que poderíamos pensar no que toca à paz nestes territórios. A paz parece nunca ser possível ali. Israel nunca desistirá de ser um Estado. Lutaram muito para chegar ali. Os judeus também pertencem a este local. O que fariam num estado palestiniano? Com certeza seriam perseguidos, vítimas de graves violações dos direitos humanos, como acontece no sentido inverso hoje. Iniciar-se-ia, com certeza, uma nova Diáspora de judeus pelo mundo.
Os palestinianos, no entanto, não têm culpa dos erros cometidos pela ONU em 1948 e já foram bastante penalizados por isso. Mereciam o seu estado e o seu território independente e pelo qual tanto lutam. Há palestinianos espalhados pelos quatro cantos do mundo. Estão refugiados porque a ONU criou um novo estado no que era o seu país. Mas, hoje, 70 anos depois, as coisas têm outra dinâmica. A paz poderia ser possível se Israel retira-se da Palestina. Se houvesse dois Estados de facto e se os colonatos desaparecessem. Demasiados SE!? Mas seria possível?
Os colonatos em Belém
A questão de Jerusalém iria ser muito complicada mas o tempo poderia trazer a criação de uma cidade-estado tipo Vaticano, ou como está até agora, sob tutela da ONU. No entanto, os palestinianos não querem dois estados. Não querem a Cisjordânia como uma Palestina independente. Querem o desaparecimento do estado de Israel. Isto os judeus nunca irão permitir. Por outro lado, a política de Israel também não parece coadunar-se minimamente com os diálogos dos acordos de paz. Vemos à nossa volta colonatos que parecem autênticas cidades onde a população judaica tem porte de arma para se defender dos palestinianos. E eu pergunto-me… não são os colonos que estão a invadir a Cisjordânia? Quem se deveria estar a defender-se ali em Belém? A construção de colonatos ocorre à nossa frente ali em Belém.
O Muro da Cisjordânia em Belém
O muro da Vergonha cresce a olhos vistos em Belém e na Cisjordânia. Estarão estes acordos a criar falsas esperanças na comunidade internacional? Por terras de Israel e da Palestina ninguém parece acreditar neles e Belém é exemplo disso. Para que servem então? Ou melhor, para quem servem então? Será mais um jogo político para preparar algo que aí virá?
A realidade palestiniana é muito mais dura do que poderíamos pensar e não é só ali em Belém. O estado da Palestina não existe de facto e a Autoridade Palestiniana não tem “grande autoridade” por ali!
Na Cisjordânia, a Autoridade Palestiniana só controla 3% do território que se resume a algumas cidades tais como Ramallah, Belém, Nablus, Jénin, Jericó e parte de Hebron. Esta é a chamada Zona A. 70% do território está na chamada Zona C, controlada militarmente pelo exército israelita e onde a Autoridade Palestiniana não consegue intervir. Está na sua maioria ocupada por colonatos ou áreas actualmente despovoadas. Os restantes 27% do território é a chamada Zona B, controlada militarmente por Israel mas com população palestiniana.
Quando visitámos a zona do muro da Vergonha, em Belém, caminhamos ao longo de alguns quilómetros ao seu lado. Ficamos aterrorizados com o que vimos ali em Belém. Há secções do muro que cruzam cemitérios árabes de Belém e que foram profanados e vandalizados. Há jovens que vivem na sombra do muro em Belém, tentando brincar em paz sobre a mira das armas dos soldados israelitas. Tudo demasiado duro para ser assimilado num único dia em Belém.
Estamos num dos locais mais sagrados para as três religiões monoteístas, Belém. Cristo nasceu ali há pouco mais de 2000 anos. Ali em Belém, a menos de um quilómetro deste campo de refugiados em Belém. Independentemente da religião, penso que todos os seus deuses teriam vergonha de ver o que se passa ali. Estariam desiludidos com a espécie humana, com aquilo que chamamos de “humanidade” e que nos distingue dos restantes animais. Que futuro haverá para estes países e povos? Tenho medo, muito medo da resposta depois do que vi ali!
Nesta viagem a Belém ficamos alojados mesmo num subúrbio da cidade, numa casa particular de uma família ligada a uma missão cristã de paz no território da Cisjordânia. Foi outra experiência também muito interessante passar a noite ali e sentir o medo que paira nas ruas, onde parece haver recolher obrigatório.
Nós visitámos Israel e a Palestina, em 2010, aquando de uma viagem de dois meses pelo Médio Oriente em que visitámos o Egipto, Jordânia, Síria, Israel e Palestina.
SEGURO DE VIAGEM PARA VIAJAR EM ISRAEL E PALESTINA (cobre Covid-19 e teste positivo)
Israel e Palestina não fazem parte integrante da União Europeia, sendo assim, é altamente recomendável fazer seguro de viagem para viajar para Israel e Palestina, já que o Cartão Europeu de Saúde não funciona. Nós fizemos o seguro de viagem da IATI ESTRELA, pelo qual pagamos 52€, para os dois, para 10 dias. Faça também o seu seguro com 5% de desconto usando este link.
Se vai visitar Israel e a Palestina estes são alguns artigos do nosso blogue que lhe podem interessar
- CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA – Um artigo com a explicação dos conflitos que assolam o Médio Oriente nos territórios de Israel e Palestina. Um artigo de leitura obrigatória para quem viaja no Médio Oriente.
- VISITAR JERUSALÉM – O nosso artigo sobre Israel e o que visitar na cidade que está na origem das três religiões monoteístas e que é o centro do conflito entre a Palestina e Israel há séculos.
- VISITAR HEBRON – Um artigo sobre a nossa visita à cidade de Hebron, um dos locais mais perigosos na Cisjordânia, Palestina e da nossa experiência intensa na cidade.
- VISITAR BELÉM – O nosso artigo sobre a visita à cidade de Belém, onde visitámos o local de nascimento de Cristo, o muro que divide Israel da Palestina e um campo de refugiados da ONU, construído em 1948 mas ainda em actividade.
- VISITAR TELAVIVE – Um artigo cheio de dicas para visitar Telavive e explorar a capital de Israel.
- VIAJAR EM ISRAEL E PALESTINA – Um artigo sobre os locais onde dormimos na Terra Santa, Israel e Palestina, durante a nossa viagem no Médio Oriente.
- VISITAR MASSADA – Um artigo sobre a nossa visita a Massada, a maravilhosa fortaleza no deserto de Negev, na Cisjordânia.
- VISITAR QUMRAM – Qumram é uma localidade na Cisjordânia, Palestina, onde foram descobertos os manuscritos do Mar Morto. O relato da nossa visita.
- VISITAR TZFAT – A nossa visita à cidade de Tzfat, no norte de Israel, e próximo da fronteira com o Líbano.
- VISITAR CESAREIA – Um artigo sobre a nossa visita às ruínas romanas de Cesareia, em Israel, cheio de dicas de viagem.
- VISITAR JERICÓ E O MAR MORTO – Um artigo sobre a nossa experiência a visitar Jericó, as ruínas na margem do Mar Morto e a visita também ao mar.
- VISITAR RAMALLAH – O artigo sobre a nossa a nossa visita à cidade que é capital da Cisjordânia e da Palestina.
- FRONTEIRA ENTRE JORDÂNIA E ISRAEL – O nosso artigo sobre o cruzamento de fronteira por terra entre a Jordânia e Israel, na nossa viagem pelo Médio Oriente.
- TRANSPORTES NO MÉDIO ORIENTE – Um artigo sobre os modos de transporte que usamos para viajar no Médio Oriente, cheio de curiosidades e momentos de humor.
- VIAJAR NO MÉDIO ORIENTE – Um artigo criado para responder à questão de se é seguro viajar no Médio Oriente. Veja tudo aqui.
- ROTEIRO MÉDIO ORIENTE – O artigo com o roteiro que fizemos na nossa viagem no Médio Oriente, desde o Egipto, Jordânia, Síria, Israel e Palestina.
- SEGUINDO OS PASSOS DE JESUS EM ISRAEL E NA PALESTINA
Olá Carla, como é que vocês foram ao campo, em sherut ? Táxi partilhado ? Em Janeiro vou andar por aqui, pretendo também ir a Hebron,Ramalah e Nablus.
Beijos e abraços !
Ao campo de refugiados acho que fomos a pé. Já não me recordo bem, mas penso que fomos a pé para lá e depois apanhamos uma carrinha de regresso ao centro de Belém. Aquilo não é longe.
Vou fazer todos os possíveis para ir aqui o mais breve possível. Obrigado por este post. A Palestina merece.
Merece mesmo 😀