Era dia de explorar os arredores de Yazd. Locias perto da cidade, visitáveis num só dia, e que dão um excelente passeio para conhecer a cultura do Irão nos arredores de Yazd. Os arredores de Yazd estão cheios de aldeias de adobe, deserto, mausoléus e locais de culto que vale a pena explorar.
Habas é o homem do dia. É com ele que vamos explorar os arredores de Yazd. Estamos à porta do deserto e há dezenas de aldeias à volta onde ainda se mantém um estilo de vida tradicional. Resolvemos embarcar numa tour pelos arredores de Yazd que arranjamos no Silk Road Hotel, por 1.300.000RY (cerca de 55€). Só vamos os dois porque não há mais turistas por cá.
O Habas é o nosso condutor e com o seu sorriso aberto e genuíno guia-nos o dia todo por Meybod, Kharanaq, Chak Chak e pelo deserto de Dasht-e Kavir.
Meybod, a 52 km de Yazd, é uma cidade com mais de 1800 anos. Apesar de Habas não falar inglês (nem nós farsi) conseguimos entender-nos perfeitamente. Começamos por visitar o castelo de Narein, construído em adobe no período Sassaniano, e desfrutar das magníficas vistas sobre a cidade.
Por companhia, o Habas arranjou-nos um jovem militar. O Habas sentou-se no lugar do militar, provavelmente a única sombra existente, e o jovem andou connosco no castelo. Também não fala inglês mas quando passa por alguém diz “portuguiiississse” e aponta orgulhosamente para nós. No final da visita, e depois de nos mostrar todos os cantos do castelo, tiramos uma fotografia todos juntos. O jovem militar está contente: são os primeiros “portuguiiississse” com quem tem uma fotografia.
Deixamos para trás o jovem militar e seguimos com o Habas até à caravancerai, uma antiga estalagem que acolhia os mercadores que passavam em caravanas de camelos. Este caravancerai de Meybod terá tido bastante importância durante a Rota da Seda. A caravancerai é um edifício retangular com um átrio enorme em torno do qual existem vários compartimentos que alojam os viajantes. No centro, existe um poço coberto para captação de água subterrânea e que hoje alberga um pequeno café.
Em frente à caravancerai de Meybod existe um edifício impressionante. Os iranianos chamam-lhe a “casa do gelo” ou yakh dan. Esta construção data da Era Safávida e consiste num edificio circular, em adobe, onde era armazenado o gelo. A grande questão é: De onde vem o gelo? Estamos no meio do deserto! É Abril e o calor é abrasador. Como colhem eles gelo para armazenar neste edifício?
Mesmo sem falar inglês, Habas mostra-nos o local onde se “fazia” o gelo em Meybod. No exterior, duas piscinas eram cheias de água e durante a noite, devido às fortes amplitudes térmicas diárias registadas, a água congelava. No início da manhã, o gelo era transportado para dentro do edifício e utilizado de acordo com as necessidades.
Mesmo sem falar inglês, Habas foi muito mais do que um condutor, foi um guia fabuloso e incansável. Tentava explicar-nos tudo, mesmo em farsi, e até nos ofereceu o almoço. Comprou-nos umas sandes gigantescas e almoçamos no chão da casa do senhor que nos iria guiar os camelos pelo deserto. Os iranianos são um povo extremamente afável e generoso. Habas foi o homem do dia em Meybod, mas apenas deste dia. Todos os dias tivemos homens e mulheres que, tal como ele, tornaram a nossa viagem no Irão inesquecível.
Visitar Chak Chak… pinga, pinga… | Irão
No deserto rochoso de Dasht-e Kavir, praticamente suspenso na vertente rochosa está Chak Chak, o maior centro de peregrinações dos zoroastrianos. A religião zoroástrica é uma das mais antigas do mundo, tendo praticamente desaparecido da face da Terra, com excepção de alguns lugares na Índia e no Irão.
Esta religião foi uma das primeiras a desenvolver o ideal do monoteísmo e o ideal da luta do bem contra o mal, sendo o culto da luz e do fogo uma metáfora da luta entre o conhecimento e a ignorância. O símbolo da religião é o Fravahar, que representa o espírito que consegue atingir Deus após a morte. Diz-se que os 3 reis magos que adoraram e presentearam o nascimento de Cristo eram zoroastrianos. Os zoroastrianos seguem Zoroastro (ou Zaratrusta) que terá nascido entre 1000 a 1500 anos antes de Cristo.
Os fiéis acreditam que a Terra não deve ser conspurcada com restos mortais humanos, daí que não os enterrem (evitando assim a contaminação dos solos) e não os cremem (evitando a contaminação do ar). Para se desfazerem dos cadáveres, os zoroastrianos colocam os corpos nas designadas Torres do Silêncio, que são edifícios circulares, a céu aberto, onde os corpos ficam expostos e são comidos por aves necrófagas. Hoje, nas proximidades de Yazd, as Torres do Silêncio já não são utilizadas, ao contrário daquelas que vimos em Mumbai, na Índia. Os poucos zoroastrianos que ainda existem nas comunidades iranianas colocam os seus mortos em sepulturas cimentadas tentando evitar assim a conspurcação da Terra.
Entre 14 e 18 de Junho é a Chak Chak que rumam os peregrinos zoroastrianos para o festival anual. Fora dessa data, o local está mais ou menos deserto. Foi assim que nós o encontramos. Os edifícios que albergam os peregrinos estão vazios e apenas vimos algumas pessoas no Templo do Fogo de Pir-e-Sabz.
Vale a pena subir a montanha para desfrutar de uma vista fantástica sobre o vale. Chak Chak significa pinga, pinga. Diz a lenda que a princesa sassânida Nikbanuk refugiou-se neste local aquando da invasão árabe e, como não havia água, sacrificou os seus homens atirando-os pela ravina abaixo, começando a água a pingar. Hoje cai uma pinga dentro do templo mas não é suficiente para esquecer o calor abrasador que está lá fora. O uso do lenço no Irão é, para mim, um sacrifício, mas ainda mais nestes dias de calor em que me sinto como se estivesse de cachecol. Imaginar que estou numa queda de água e imaginar o som da água a pingar faz-me relaxar. Pinga, pinga, ou Chak Chak, está longe de ser um paraíso mas é definitivamente um lugar a visitar.
Visitar KHARANAQ – Uma aldeia que me leva a viajar nas minhas memórias geográficas no Irão
O Irão que até hoje preencheu o meu imaginário foi aquele que encontrei em Kharanaq, a cerca de 70 km de Yazd. Kharanaq é uma aldeia de adobe com mais de mil anos, contudo os historiadores acreditam que esta área do vale tenha ocupação humana há mais de 4000 anos.
Outrora uma aldeia imponente, hoje são poucos os aldeões que ainda aqui vivem. A aldeia está deserta, as casas estão abandonadas, as paredes revelam a erosão provocada pelas precipitações.
Apesar das condições, ainda se vêem alguns aldeões que resistiram ao poder atractivo das grandes cidades. Permanecem aqui e vivem da criação de gado caprino e das culturas que retiram dos campos graças a um sistema de irrigação milenar. Tentam a todo o custo combater as adversidades do clima e a aridez dos solos. O leito do rio está completamente seco. A água tem que ser transportada através de um aqueduto que vem da montanha e depois é distribuída através de pequenos canais. A luta entre o Homem e a natureza trava-se aqui todos os dias.
A aldeia tem duas mesquitas: uma construída em adobe e que data do século XVII com um minarete que oscila devido à utilização de madeira no seu interior; a outra, do outro lado do vale, é mais moderna, colorida e está completamente isolada junto à base da montanha no meio dos campos agrícolas.
Kharanaq faz-me viajar no tempo. Parece que podia estar aqui há 100 ou 200 anos atrás que tudo seria igual. No entanto, sou levada a pensar que talvez nessa altura pudesse ter visto crianças. Na Kharanaq de 2012 as crianças não existem. Ficaram apenas os idosos, que tal como a aldeia, travam uma luta contra o tempo. Mais uma batalha entre o Homem e a natureza, mas esta o Homem está condenado a perdê-la.
Se vai viajar para o Irão, estes são alguns artigos no nosso blogue que lhe podem interessar
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- VISITAR PASARGADAE – Um artigo com tudo o que precisa de saber para visitar a antiga cidade de Ciro, o Grande, desde Shiraz, e onde terão nascido o que mais tarde chamamos “Direitos Humanos”.
- VISITAR PERSÉPOLIS – Um artigo super completo sobre as maravilhosas ruínas da cidade de Persépolis, no Irão, a antiga capital Persa, desde Shiraz.
- VISITAR YAZD – Um artigo com tudo o que precisa de saber para visitar a cidade de Yazd, maravilhosa e cheia de coisas para descobrir.
- VISITAR OS ARREDORES DE YAZD – Tudo o que precisa de saber para visitar os locais mais importantes dos arredores de Yazd, nomeadamente Meybod, Chak Chak e Kharanaq.
- VISITAR O DESERTO DE DASHT-E-KAVIR – Um artigo com tudo o que precisa de saber para visitar o deserto de Dasht-e-Kavir, nas imediações de Yazd, no Irão.
- VISITAR MASHHAD – Tudo o que precisa de saber sobre visitar Mashhad, um dos lugares mais sagrados do Irão e do Islão.
- VISITAR TABRIZ – Tudo o que precisa de saber para visitar Tabriz, uma das cidades mais importantes da Rota da Seda e por onde passou Marco Polo.
- VISITAR KANDOVAN – Tudo o que precisa de saber para visitar a povoação de Kandovan, a Capadócia do Irão.
- VISITAR ORMUZ – Um artigo com tudo o que precisa de saber para visitar a ilha de Ormuz, no Golfo Pérsico, está neste artigo sobre o Irão.
- VISITAR MINAB – Tudo o que precisa de saber para visitar Minab, uma aldeia Bandari, no Golfo Pérsico, no Irão, está neste artigo.
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- VISITAR KERMAN – Tudo o que precisa de saber para visitar Kerman, no Irão, e desfrutar da cidade da Rota da Seda da melhor maneira está neste artigo.
- VISITAR KALUTS – Um artigo com o que precisa de saber para visitar os Kaluts, os castelos de areia no deserto do Irão.
- VISITAR RAYEN – Um artigo com o que precisa de saber para visitar Rayen, uma cidade de areia no deserto do Irão.
- VISITAR MAHAN – Um artigo com o que precisa de saber para visitar Mahan, um mausoléu no leste do Irão.
- VISITAR BAM – Um artigo com o que precisa de saber para visitar Bam, uma cidade de adobe no leste do Irão.
- VISITAR ABYANEH – Tudo o que precisa de saber sobre a nossa passagem pela aldeia tradicional do Irão.
- ROTEIRO PARA O IRÃO – Um artigo com o nosso roteiro a explorar o Irão durante cerca de duas semanas.
- 12 IMAM XIITAS – Tudo o que precisa de saber sobre Mashhad e perceber a história dos 12 imams xiitas.
- DORMIR NUM PALÁCIO EM ISFAHAN – A nossa experiência a dormir num palácio na cidade de Isfahan, no Irão.
- VISTOS NA ROTA DA SEDA – Um artigo em forma de crónica e balanço da odisseia dos vistos para a nossa viagem na Rota da Seda.
- VISITAR NO NOWRUZ – A nossa experiência em viajar no Irão durante o ano novo Persa, o Nowruz.
- COMBOIO DE KERMAN A MASHHAD – A nossa crónica de viagem sobre a nossa experiência no comboio entre Kerman e Mashaad.
- VIAJAR NA ROTA DA SEDA – Tudo o que precisa saber sobre a Rota da Seda, nomeadamente a sua história, países que atravessa e como fazer esta viagem.