Bijapur situa-se no coração do território indiano, que é o planalto do Decão, uma vasta área que constitui a maior parte do centro e do sul do país, delimitado por cadeias montanhosas, formando um planalto de baixa altitude em forma de triângulo. É neste planalto que a história do domínio do território indiano se desenrolou durante séculos, sucedendo-se variadas dinastias, que se combateram pela hegemonia política, militar e religiosa. A partir do século XI, o subcontinente indiano captou as atenções de conquistadores muçulmanos, que invadiram o território, trazendo com eles a guerra, claro, mas também uma nova cultura, religião, arquitectura e arte.
O legado islâmico na Índia teria altos e baixos ao longo dos séculos seguintes, mas a Índia nunca mais foi a mesma, e o Islão passaria a fazer parte da identidade daquela parte do globo até aos dias de hoje. Em particular, no planalto do Decão, o primeiro reino islâmico a dominar a área foi o dos sultões Bahmani, mas, no final do século XV, a sua desintegração levou à formação de vários reinos muçulmanos mais pequenos, entre os quais o reino de Bijapur.
Durante 200 anos, os sultões Adil Shahi governaram esse império, dotando a sua capital, de um conjunto impressionante de edifícios, que trouxeram até aos dias de hoje a memória desses dias.
Curiosamente, os reinos islâmicos guerreavam tanto entre si que, às vezes, se esqueciam dos forasteiros. Os portugueses, após uma tentativa de invasão repelida, conseguiram conquistar, em 1510, a cidade de Goa, o melhor porto da região (e não mais a abandonando até 1961). No entanto, em 1565, os mesmos sultanatos esqueceram momentaneamente as rivalidades e uniram forças para derrotar a dinastia hindu de Vijayanagara, tomando a cidade que hoje é conhecida como Hampi. Finalmente, seria o imperador Aurangzeb que poria o fim aos sultanatos do Decão, iniciando uma nova era.
Hoje, Bijapur é uma cidade muito interessante de se visitar, e uma das melhores para se apreciar o legado islâmico em território indiano.
De carroça, uma das formas mais tradicionais de explorar a região, percorremos o centro histórico da cidade. Tudo pelo preço de 500 rupias.
Na companhia de Adhil, conhecemos a população local, os mercados, a cidadela, os mausoléus, os palácios e as mesquitas. Apresentamos, a seguir, um roteiro pelos tesouros históricos e arquitectónicos de Bijapur.
1. Gol Gumbaz
O mausoléu de Gol Gumbaz (que significa “Cúpula Redonda”) é o ex-líbris de Bijapur, um edifício monumental com a segunda maior cúpula do mundo (atrás apenas da cúpula da Basílica de S. Pedro). Ali repousa o corpo de Muhammad Adil Shah (1626-1656), assim como os das suas mulheres e filhas.
A fachada principal tem um grande arco central, com pequenas janelas. Em cada canto existe uma torre octogonal de sete andares, encimada por uma cúpula em bolbo, sendo que se pode subir as escadas por uma e descer por outra.
Lá em cima, pode percorrer-se uma galeria circular (de diâmetro interior 38 m, a cerca de 33m do chão) na periferia interior da cúpula. Ali, o efeito acústico da “Galeria dos Sussurros” é por demais evidente. Se falarmos para a parede, em voz baixa, alguém que esteja diametralmente oposta, do outro lado da galeria, consegue-nos ouvir perfeitamente. O eco repetido de sons mais fortes produz também um efeito impressionante!
Preço: 500 rupias/pessoa
2. Ibrahim Rauza
O segundo ícone da cidade é o mausoléu Ibrahim Rauza, onde existem túmulos e mesquitas. É descrito como um dos mais belos edifícios do planalto do Decão. O complexo é dominado pelos dois edifícios “gémeos”, um o túmulo de Ibrahim Adil Shah II (1580-1626), o outro uma mesquita.
Ambos foram construídos numa plataforma elevada, a qual se tem acesso percorrendo um jardim e atravessando uma torre com quatro minaretes. Os dois edifícios distinguem-se pela delicadeza do trabalho decorativo e são adornados por belos minaretes, existindo um tanque entre os dois edifícios.
Diz-se que este mausoléu serviu de inspiração para o Taj Mahal.
Preço: 500 rupias/pessoa, Museu: 5 rupias/pessoa
3. Cidadela de Bijapur
Rodeada de muralhas e um fosso, a cidadela incluía alguns palácios e jardins dos sultões Adil Shahi. A zona está hoje engolida pela malha urbana da cidade moderna e alguns dos edifícios estão em muito mau estado. No entanto, distingue-se o Gagan Mahal, a sala de audiências do xá Ali Adil I, sem telhado mas com um grande arco, e rodeado ainda hoje de belos jardins.
Para além deste, o Sat Manzil, as ruínas do palácio de sete andares de Muhammad Adil Shah, e o Jal Manzil, uma pequena torre que já foi um pavilhão de água, e que fazia parte dos jardins dos palácios, atraem os visitantes.
4. Túmulo de Ali Adil Shah II (Bara Kaman)
O túmulo de Ali Adil Shah II (1656-1672) é uma das ruínas mais belas de Bijapur. O edifício impressiona pela sua grandeza, não diminuída pelo facto de nunca ter sido concluído, mas também pela qualidade da pedra de basalto usada na sua construção.
A base da estrutura é maior do que a do próprio Gol Gumbaz, e nela estão suportados enormes arcos, que não chegaram a sustentar nenhum telhado. No centro, encontram-se as pedras tumulares de Ali Adil Shah II e familiares (os túmulos encontram-se numa cripta, por baixo). À volta do edifício existe um belo jardim.
5. Bazar da cidade
Junto ao Bara Kaman, encontra-se um dos bazares da cidade. Aí, é possível testemunhar a azáfama diária da população indiana e os costumes e roupas tradicionais.
Mesmo sem o privilégio de uma língua comum (pois poucos indianos por ali falam inglês), é possível encetar conversa com algumas pessoas e trocar sorrisos.
6. Jod Gumbaz
Estes dois mausoléus “gémeos”, encimados por cúpulas, estão intimamente relacionados com a queda final de Bijapur, às mãos do imperador Aurangzeb. Ali encontram-se os túmulos de Khan Muhammad, primeiro-ministro de Muhammad Adil Shah, e Khawas Khan, general de Sikandar Adil Shah.
Ambos foram partidários de um entendimento com os mughals e traidores na luta de Bijapur contra Aurangzeb. Depois da queda de Bijapur, Aurangzeb mandou erigir estes dois mausoléus como tributo aos dois homens.
Quando visitámos estes mausoléus, várias mulheres (aparentemente viúvas) estavam presentes no local. Uma delas, com a cara queimada com ácido, impressionou-nos particularmente. Apesar de não conseguirmos superar a barreira linguística, conversamos, abraçamo-nos e tiramos fotos, mas não conseguimos perceber a causa do “castigo” infligido aquela mulher.
7. Mehtar Mahal
É uma pequena torre que servia de entrada a uma mesquita e um jardim. Está em mau estado, mas ainda detém uma beleza e graciosidade que não passam despercebidas.
Aparentemente estão em curso algumas obras de restauração, mas pode-se entrar e subir ao primeiro andar.
8. Jama Masjid
A mesquita de Sexta-Feira (Jama Masjid) foi começada por Ali Adil Shah I (1558-1580), mas nunca foi concluída. Os arcos são graciosos, e o chão da mesquita, em mármore, está dividido em 2250 musullahs.
Estes espaços para oração individuais imitam o efeito dos tapetes que se colocam em horas de oração. O mihrab central está decorado com inscrições do Corão em caligrafia dourada.
9. Upali Buruz
Construída em 1584, é uma torre isolada, em forma de cilindro, que fazia parte da muralha de Bijapur. Pode subir-se as escadas exteriores, e lá em cima pode admirar-se dois enormes canhões e uma vista panorâmica sobre a cidade.
10. Taj Bawadi
Foi construído por Ibrahim Adil Shah II em honra da sua mulher, a Rainha Taj Sultana. É um tanque com uma área considerável, com uma entrada em arco e com escadas que descem até ao nível da água.
Quando o visitámos, não estava aberto e só pudemos ver de fora.
11. Malik-e-Maidan
O seu nome significa “Monarca das Planícies” e as suas dimensões justificam-no. Fundido em 1549, este canhão colossal (um dos maiores canhões medievais da Índia) tem mais de 4 m de comprimento, quase 1,5 m de diâmetro e pesa cerca de 55 toneladas!
Terá sido usado na batalha de Talikota, entre os sultanatos do Decão e o império de Vijayanagara (com a derrota deste último), e a sua superfície tem inscrições em árabe e persa. Encontra-se agora na Serzi Buruz, um dos bastiões do antigo forte de Bijapur.
Era hora de seguir…
Depois de termos percorrido o nosso roteiro em Bijapur, estava na hora de seguirmos viagem. Ao final do dia, apanharíamos o Gol Gumbaz Express, o comboio para Badami. Iríamos explorar uma das áreas com mais história na região, mas desta vez conhecendo o legado hindu de uma das dinastias pré-islâmicas mais poderosas da história da Índia.
Dicas
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- Bijapur é servido por comboio através da estação de Vijayapur.
- Ficamos alojados no Hotel Mayura Adilshahi Bijapur, um hotel governamental bem localizado no centro da cidade. Era limpo e muito porreiro. Pagámos 12€ pelo quarto duplo com wc.
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