Quando saímos de Jiayuguan sabíamos que estaríamos agora dentro da China Imperial. Apanhamos um comboio nocturno com destino a Lanzhou, uma cidade industrial chinesa que, à semelhança de quase todas as outras, nos recebeu com uma grande central termoeléctrica e o seu smog. Estivemos apenas 20 minutos na cidade. O nosso destino era o planalto tibetano, na província de Gansu, onde existem várias localidades tibetanas, e a maioria de população é deslocada do território tibetano ocupado.
A região de Amdo é uma das 3 que compunham o antigo Tibete (as outras duas são U-Tsang e Kham) e foi aqui que nasceu o 14º Dalai Lama, o actual. Governada por dirigentes locais desde o século XVIII, Amdo goza de uma forte presença chinesa, mas de um carácter menos “castrador” do que a região de U-Tsang (onde se situa Lhasa). Para visitar a região de Amdo não é necessário permissão especial do governo chinês, nem fazer percursos integrados em agências turísticas (única forma de visitar a região de Lhasa na actualidade). Sendo assim, decidimos seguir este percurso na Rota da Seda.
A região de Amdo intergra áreas das províncias chinesas de Gansu, Sichuan e Qinghai, e a melhor porta de entrada para a região são Lanzhou e Xining. Decidimos entrar por Lanzhou e sair por Xining, dando uma pequena volta pelo planalto tibetano e estabelecendo contacto com o budismo tão característico desta região.
Em Lanzhou apanhamos um autocarro (mesmo em frente à estação de comboio) para Xiahe. Infelizmente o autocarro não era directo e o que deveria ter sido uma viagem de 4 horas transformou-se numa viagem de 7 horas. Paramos cerca de duas horas na cidade de Linxia, uma povoação dominada por uma maioria muçulmana, Nesta paragem não visitamos nada. Permanecemos dentro ou junto ao autocarro que “estava quase a sair”. Deu, no entanto, para ver o rio Amarelo, cujas águas castanhas e lamacentas faziam jus à sua designação.
As viagens de autocarro em Gansu não são melhores nem piores do que nos outros lugares do mundo. Destacaria apenas a “perícia” do nosso motorista que quando viu que o caixote do lixo estava cheio, parou o autocarro e o despejou para a estrada. Estávamos prontos para o resto da viagem.
Chegamos a Xiahe, a nossa primeira paragem por terras do planalto tibetano. Esta cidade monástica é dominada pelo mosteiro de Labrang e toda a cidade gira à sua volta. Há monges budistas por todo o lado, que usam os restaurantes, os bares, os cafés e as lojas. São eles que dinamizam a cidade. Infelizmente não tivemos tempo para explorar os arredores, onde existem aldeias tibetanas bastante típicas. Restringimo-nos a uma magnifica e curta visita ao mosteiro. Estamos na nossa última semana da Rota da Seda e, como tal, o tempo está bem contado. Infelizmente, já não há tempo para desvios.
Chegados a Xiahe alojamo-nos numa guesthouse gerida por monges e onde os peregrinos oriundos de diversos lugares do mundo e do Tibete se reúnem e alojam. O café-restaurante está cheio de monges. O nosso quarto não tem cama. Tem uma plataforma com duas colchonetes estendidas separadas por uma pequena mesa de trabalho. Não temos casa de banho nem banho. É um lugar humilde, simples e discreto. Mas, também é assim o budismo tibetano.
Xiahe e o mosteiro de Labrang foram a nossa introdução ao budismo tibetano e ao Tibete. Fomos recebidos por chuva e nuvens cada vez mais negras. No final da nossa visita ao mosteiro tivemos, inclusive, de fugir a correr da chuva forte. Recolhemo-nos num restaurante simpático onde experimentamos pão tibetano (uma maravilha), pizza de iaque e bife de iaque.
Mas, Amdo ainda tinha muito mais para nos oferecer. No dia seguinte pela manhã iríamos sair para Tongren e a porta do Tibete tinha sido aberta…