Na ilha de Santiago, Cabo Verde, o infame Campo de Concentração do Tarrafal… Uma história que não pode ser esquecida.
Os Campos de Concentração
O Campo de Concentração de Sachsenhausen, nos arredores de Berlim, foi um dos primeiros campos a ser instituído pelos nazis, em meados de 1936. Numa fase inicial, o campo destinava-se aos oponentes ao regime de Hitler, mas gradualmente transformou-se num campo de trabalhos forçados e, mais tarde, num local de extermínio de judeus e prisioneiros de guerra soviéticos. A realidade destes campos choca qualquer um que os visita, e esse choque pode levar-nos a pensar que esta realidade é única e exclusivamente pertença do regime nazi e da sua ideologia. Mas a verdade é que, ao mesmo tempo que a Alemanha era governada por um regime fascista totalitário, Portugal e outros países também o eram. E as semelhanças não param aqui.
Campo de Concentração do Tarrafal
O Regime do Estado Novo demonstrou, ao longo dos seus 40 anos de existência, que conseguia ser também brutal na repressão, eficaz na tortura, desumano no tratamento daqueles que eram considerados inferiores. A acção da PIDE, Polícia Internacional e de Defesa do Estado, quer em Portugal, quer nas colónias, é o exemplo paradigmático do carácter repressivo e castigador do regime.
Ao mesmo tempo que Sachsenhausen abria as suas portas em Berlim, o regime salazarista decidia instituir um campo de concentração na ilha de Santiago, Cabo Verde, o infame Campo de Concentração do Tarrafal. O Tarrafal começou a funcionar em 29 de Outubro de 1936, recebendo os primeiros prisioneiros, oponentes políticos ao regime, camponeses, operários, soldados, marinheiros, estudantes, intelectuais, sindicalistas.
Quando visitei o Tarrafal não pude deixar de reparar nas semelhanças entre o ‘nosso’ campo e o dos nazis. O Tarrafal é um sítio isolado, longe de olhares curiosos, mas localizado nos arredores de uma pequena localidade, os altos muros, o fosso, os barracos, a prisão, as celas de isolamento, os espaços comuns diminutos, a dieta de fome, os locais de trabalho forçado. Tudo era igual, a mensagem era a mesma, ganhando o local o epítome de ‘Campo da Morte Lenta’. O médico do campo do Tarrafal dizia “não estou aqui para curar, mas para passar certidões de óbito”. Claro que os nazis levaram a repressão e a política racial a extremos de insanidade e genocídio únicos na história, mas no Tarrafal o regime do Estado Novo também mostrou a sua verdadeira natureza.
Entre 1936 e 1954, o Tarrafal funcionou como ‘colónia penal’ destinada a cidadãos ‘desafectos do regime’. Foram 32 os prisioneiros políticos que perderam a vida no Campo do Tarrafal, sendo o mais conhecido o então Secretário-Geral do PCP, Bento Gonçalves, que perde a vida a 11 de Setembro de 1942. Os restantes sofreram mazelas físicas e psicológicas que os iriam marcar para a vida depois do Tarrafal.
No pós-guerra, derrotado o regime fascista nazi, o regime fascista português foi pressionado para que o campo do Tarrafal fosse encerrado. Isso acabou por acontecer e o Tarrafal encerrou em 26 de Janeiro de 1954. Mas os campos de concentração e de morte têm uma mórbida tendência em ressuscitarem, sob a mão do mesmo regime, ou de regimes diferentes.
Tarrafal com Campo de trabalho de Chão Bom
Sachsenhausen teria uma segunda vida como campo de concentração soviético; o Tarrafal abriria novamente as portas, sob a gestão do mesmo regime, mas destinado a prisioneiros diferentes, desta vez os partidários dos movimentos de libertação anticoloniais e independentistas que, no início dos anos sessenta, começaram a surgir em Angola, Guiné-Bissau e Moçambique. O Tarrafal foi designado por um novo nome, ‘Campo de Trabalho do Chão Bom’ (o nome da pequena aldeia junto ao campo do Tarrafal), mas a filosofia continuou a mesma. Mais de duzentos prisioneiros passariam pelo campo do Tarrafal, alguns perdendo lá a vida. A repressão e a inumanidade só terminariam uma semana depois de 25 de Abril de 1974 no Tarrafal. No dia 1 de Maio, os últimos prisioneiros do Tarrafal eram finalmente libertados.
O Campo de Concentração do Tarrafal, ou o que dele resta, agora como Museu da Resistência, é uma visita obrigatória para todos os portugueses no Tarrafal. Ensina-nos que fomos capazes de atrocidades que só associamos a outros; ensina-nos que a democracia é um regime frágil; ensina-nos que a liberdade não pode ser encarada como garantida e que devemos lutar por ela todos os dias. O Tarrafal é memória viva, mais concreta e eficaz que o papel dos manuais de história. Mas mesmo a história, e a memória a ela associada, têm de ser alimentadas e acarinhadas, para não morrerem no esquecimento. Pois, como Jorge Santayana escreveu, “Aqueles que não recordam o passado, estão condenados a repeti-lo”. Recordemos o Tarrafal, então, para que nunca mais se repita em solo português.
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A prisão do Tarrafal deixou um legado de 36 vitimas, não 32. Durante todo o seu periodo de existência de 1936 até ao 25 de Abril 1974, com as devidas interrupções. No total 32 Portugueses, 2 Angolanos e 2 Cabo Verdianos. Durante o total dos 40 anos de ditadura…
Comparar com qualquer campo de concentração Nazi ou outro é no mínimo ridículo. Só nas mãos dos Nazis o número de vitimas de Sachsenhausen pode ser multiplicado por 1000!! Nas mãos da União Soviética tambem não era um campo de férias.
Colónias penais sempre existiram e infelizmente continuam a existir. No Tarrafal muitos sofreram (<250), mas não só prisioneiros políticos, de facto a maioria foram prisioneiros de delito comum. Facto tendencialmente ignorado na propaganda para "turista ver".
Nomes como Guiana Francesa, Austrália, África do Sul, Sibéria, Nova Zelândia, Guantanamo… Tornaram-se famosos por algum motivo.
Uma breve comparação com QUALQUER dos regimes contemporâneos do Estado Novo, faria o Diabo corar de vergonha. Até a nossa vizinha Espanha deixou valas comuns que em número só ficam atrás do Cambodja!!
Fiquem bem.
Obrigada pelo comentário. A semelhança entre os campos está no principio que leva à sua existência, não na escala.
Uma visita impressionante, como se chega a tanta crueldade!! Adorei o vosso post, dêm uma olhadinha no meu sobre a minha visita a este local. Boas viagens
Obrigada, Luís.
Como foram de praia para o tarrafal?
Fomos de camioneta, umas carrinhas de 7 lugares.
Obrigado pela sua partilha esta, tão legal.